Nathani 09/07/2020À sombra das moças em florNeste segundo volume de "Em busca do tempo perdido", o narrador Marcel está em sua adolescência e irá pela primeira vez da inocência dos olhares e das cartas de amor até a desilusão amorosa. Assim como o primeiro volume, não é uma leitura muito fluida com grandes acontecimentos, ação e tempo demarcado. É uma escrita densa e belíssima, devido ao estilo de fluxo de consciência.
Discorre por páginas e páginas sobre amor, juventude, expectativas, literatura e experiências que irá conhecer pela primeira vez. Proust tem a capacidade de transformar os elementos mais corriqueiros em poesia, as palavras e devaneios aqui são mais importantes do que a história em si.
Marcel é apaixonado por Gilberte, filha de Swann que após se casar com Odette não tem mais frequentado a sua casa e nem a maioria das reuniões da alta sociedade. Além disso, Swann tem evitado Marcel para sua total angústia já que além da paixão por sua filha, ele nutre pelo próprio Swann muita estima. Apesar das iniciativas de Odette em convidar Marcel a seus jantares, Gilberte não parece mais tão interessada em seu amigo.
Marcel costuma depositar toda sua confiança em pessoas que considera mais sábias e cultas, muitas vezes até se sentindo inadequado por ter uma opinião diferente. Ao conhecer Sr. De Norpois em um dos jantares de Odette, terão longas conversas sobre literatura e teatro. Especialmente sobre Bergotte, ídolo literário de Marcel, o qual Norpois critica muito para sua surpresa, o que o leva a questionar seus próprios gostos.
"Apenas, quando se crê na realidade das coisas, usar um meio artificial para fazer com que se mostrem não equivale inteiramente a sentir-se próximo delas. Achava que já não era a Berma a quem via, e sim a sua imagem na lente de aumento. (...) Qual das duas Berma era a verdadeira?"
Berma era uma atriz de teatro que Marcel era muito fã por ouvir tantos elogios à sua atuação. Porém, ao finalmente assisti-la pela primeira vez, percebeu que não era o que ele esperava. A frustração que se seguiu é a de um menino que pela primeira vez descobre que na vida nem sempre conhecemos verdadeiramente aqueles que amamos ou admiramos, as vezes o que conhecemos é a idealização que criamos e que em nada remete a realidade.
A desilusão amorosa por Gilberte traz reflexões belíssimas de Marcel sobre como esquecer um amor, neste caso platônico. Apesar de querer esquecê-la, ele sente que está perdendo uma parte de si mesmo ao deixar esse sentimento ir embora e se questiona se deve se esforçar para esquecer ou continuar a esperar por mais que saiba ser inútil.
"Saber que não há mais nada a esperar não nos impede de continuar a esperar."
Na última parte, ele irá para Balbec, uma cidade na praia. Pela primeira vez depois de sua perda irá conhecer novas garotas e possíveis novos amores, as "Moças em flor". Ainda vemos em Marcel persistir o medo de seguir em frente e se tornar um outro alguém, desconhecido a si mesmo.
Vale muito a pena ler e acompanhar o crescimento do narrador: suas desilusões, alegrias, medos, incertezas, perdas e divagações. A escrita de Proust é algo inigualável.
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