Dirtyusedcondom 01/02/2024
Laranja irritante
Análise do livro:
Não entendi o propósito do dialeto Nadsat. Mesmo que tenha me instigado a ler mais até me adaptar, acabou tornando a experiência menos imersiva do que poderia ser pela dificuldade em entender essa linguagem, ou não me fazer levar as situações a sério. Ainda assim, é com certeza um dos pontos que torna o livro um clássico, e é um artifício que só poderia ser usado no meio em que a história foi contada, em livro. Não pude deixar de comparar com o filme, que respeita muito a obra original, mas não utiliza tanto de seu método narrativo, e por isso acredito que eles se complementam. Cada um com sua particularidade consegue expressar a mesma mensagem de maneira única, e com certeza não são populares atoa.
Análise textual:
Logo no começo, um dos personagens nos situa da estabilidade familiar e financeira de Alex, mostrando que o seu comportamento não condizia com a sua realidade. Isso é algo notável na história, a violência aqui não é tratada a partir de suas possíveis causas, mas como uma consequência da natureza humana. E a moral, no entanto, é colocada como um produto de controle, senão repressão, do indivíduo pelas autoridades que regem o Estado.
O embate da trama é o livre arbítrio, e o tema deixa implícito a maneira como essa liberdade é, na verdade, cerceada pela influência das normas que permeiam seu meio social. Dessa forma, o autor questiona a maneira como fomos induzidos a adotar um padrão de conduta que, por muitas vezes, entra em conflito com nossos instintos mais primitivos. Uma das formas mais antigas de doutrinamento é a religião, e um padre - ou sei lá o que - da obra diz:
"O que Deus quer? Será que Deus quer insensibilidade ou a escolha da bondade?
Será que um homem que escolhe o mal é talvez melhor do que um homem que teve o bem imposto a si?"
Nessa passagem, fica clara a dúvida da verdadeira existência do altruísmo. Todos estamos sempre nos censurando, corrigindo e ocultando pensamentos por medo de uma punição divina ou julgamento social. Nossas mentes são permeadas por um controle abstrato imaterial permanente, de maneira que se torna desgastante estar sob a pressão desse policiamento. Alex é nada mais que alguém que se cansou dessas correntes, e agora age de maneira impulsiva, respeitando suas vontades e, claro, lidando com as consequências.
A partir do momento em que uma sociedade punitivista pode, através do medo, controlar alguém, ela não está tornando ela uma pessoa melhor, mas uma pessoa desprovida de personalidade e ética, somente agindo com base na moralidade. Assim como é dito no trecho:
"Você pecou, suponho, mas seu castigo foi além de qualquer proporção. Eles transformaram você em alguma coisa que não um ser humano. Você não tem mais o poder de decisão. Você está comprometido com atos socialmente aceitáveis, uma maquininha capaz de fazer somente o bem. E vejo isso claramente: essa questão sobre os condicionamentos de marginais. Música e o ato sexual, literatura e arte, tudo agora deve ser uma fonte não de prazer, mas de dor."