Ludmilla Silva 20/11/2021"I'm glad my world has gotten bigger, not smaller, since I came out"Pelo que eu pesquisei e observei esse livro dividiu bastante as opiniões, é realmente 8 ou 80, quem amou, amou de verdade e quem odiou, odiou mesmo. E no final está tudo bem, a literatura não vai significar e representar a mesma coisa para todo mundo. Eu, particularmente, fui uma das pessoas que amou o livro, porém, em contraponto eu também entendo algumas das críticas das pessoas que não amaram.
As críticas principais são direcionadas aos protagonistas, Jeremy e Lukas (principalmente o Jeremy) e de como eles são egoístas e estão a todo o momento tomando atitudes infantis que vão magoar e prejudicar as outras pessoas. E eu concordo totalmente, em muitos momentos eu me via indignada com as coisas que eles faziam e ficava chateada com a falta de consideração que ambos possuíam pelo próximo e pelos amigos. Contudo, apesar disso tudo eu sinto que fui muito empática e compreensível com os personagens e com o background deles.
Não que eu concordasse com as atitudes deles, longe disso, mas em um livro de adolescentes, ambientado no ensino médio, onde eles estão no último ano e estão passando por milhares de transformações diferentes – seja pessoal ou acadêmica – é comum que os adolescentes façam merda e errem a todo o instante mesmo. Lógico, nenhum leitor é obrigado a gostar, e entendo também que às vezes isso, e a grande rivalidade existente entre os protagonistas pode ter prejudicado a leitura para alguns, mas não foi o meu caso. O fato deles serem egoístas e cometerem erros a TODO INSTANTE foi algo que não me incomodou muito, pois ali naquele contexto e naquela realidade do livro fazia sentido e de certo era compreensível.
Se fosse um livro adulto, com protagonistas adultos e não protagonistas de 16-18 anos, cometendo os mesmos erros e sendo extremamente egoístas definitivamente não funcionaria para mim (a exemplo, isso aconteceu em um livro adulto da Veronica Roth e eu odiei os personagens e consequentemente o livro), porém como foi dentro dessa ambientação eu não me importei, isto é, a meu ver, não houve uma grande suspensão da descrença. Em relação à rivalidade do Jeremy e do Lukas, eu entendo que ambos às vezes se provocavam demais e magoavam bastante um ao outro, porém acredito que no final aquilo serviu para eles evoluírem e aprenderem com seus erros. Sem contar, que pelo menos para mim a premissa enemies to lovers é bastante clara aqui, então fez sentido o modo como foi estruturado.
Confesso, que eu gostava mais do Lukas do que do Jeremy, mas meus sentimentos ficavam alternando entre os dois. E apesar de eu não conseguir nem querer justificar algumas das atitudes dos personagens eu consegui compreender muito bem os dilemas pessoais de cada um. De um lado temos Jeremy, que é um garoto trans, que se descobriu e se transacionou recentemente e ele está tentando lidar e entender a sua vida agora, uma vida que por mais que seja familiar é totalmente diferente da que ele tinha antes, ele tem problemas relacionados a aceitação de sua mãe, de seus amigos, da escola e também de seu ex. Do outro lado tem Lukas, que acabou de perder o irmão e acabou de sair de um relacionamento, que está tentando a todo o custo manter e salvar a sua família e ainda provar que ele consegue ser um bom filho e estudante, apesar de seus diversos problemas.
Eu consegui ver claramente os personagens, como eles estavam magoados e chateados e como estavam apenas tentando passar por aquele período infernal que é o último ano do ensino médio. A premissa do baile de formatura e do rei do baile foi muito interessante e gostei do desenrolar da história. Eu ria da rivalidade dos protagonistas e gostei de subtramas como o caso do bullying pelo Philip, a reforma do código da escola, e também o GSA.
Eu não sou trans, então não estou em meu local de fala, porém eu achei que o dilema de Jeremy como um garoto trans foi muito bem representado aqui. A forma como ele abordava o assunto e principalmente como ele transmitia aos leitores o que se passava na cabeça dele foi emocionante e esclarecedor. Gostei também da apresentação de personagens como Sol, que é não-binárix e também da solidariedade dos personagens, principalmente os garotos do futebol, para com o Jeremy e depois para com o Lukas.
Para ser sincera, eu gostei muito do final do livro. Gostei que o Jeremy e o Lukas ficaram juntos, meu maior medo era que eles não ficassem, e apesar de achar o Jeremy bastante egoísta eu penso que o Lukas em muitos momentos foi também, e para mim no final ambos evoluíram e estavam dispostos a mudar, a crescer e a aprender com o passado. Ambos reconheceram os erros e pareceram estar dispostos a fazer aquele relacionamento dar certo. Ademais, eu amei que nenhum dos dois foi escolhido para ser rei do baile e quem ganhou foi Sol, eu achei incrível demais e me deixou com o coração quentinho.
Obviamente, eu tenho algumas ressalvas também. A questão do autismo do Lukas eu acredito que não foi bem trabalhado, apesar de vermos o dilema dele em relação à aula de biologia avançada, muitas vezes parecia algo desassociado do seu autismo, eu gostaria de ter visto mais sobre o assunto e como ele lutava (ou não lutava) com aquela doença no seu íntimo. Eu supus que a questão do Terry foi muito jogada também, para mim, seria mais interessante ter uma construção do passado dele com o Lukas, pois isso me faria acreditar melhor no crush do Lukas nele, o que para mim, foi totalmente do nada. Gostaria também que ele tivesse sido punido por roubar o dinheiro do baile, fala sério, a escola os alunos são ricos e vem de uma posição de completo privilégio, então se eles quisessem ter punido o Terry, ele com certeza teria sido punido, um avião não impediria nada. Achei que esse ponto foi falho também.
A questão do código escolar que estava sendo reformulado para mim também ficou incompleto, seria interessante ver o processo após ter ido para a diretora, porque a impressão que eu tive foi que o esforço deles foi totalmente em vão. E por fim, a questão do Baile de Formatura. A premissa do livro todo foi essa e no momento em que chegou o baile foi tudo corrido e pouco desenvolvido. O livro tem 288 páginas, eu penso que se ele tivesse pelo menos umas 50/100 páginas a mais esses problemas poderiam ter sido resolvidas, e isso também abriria espaço para o desenvolvimento de ótimos personagens secundários (como Naomi, Sol e Ben) ao invés do foco exclusivo em Jeremy e Lucas.
Talvez eu devesse dar 4 estrelas para esse livro em função dos problemas que apontei acima, mas para mim o que pesa mais é realmente a experiência. Daqui a alguns meses eu não vou lembrar desses pormenores, eu vou lembrar de como me senti lendo ele. E de modo geral eu gostei muito. Eu me diverti, eu fiquei surpresa, eu fiquei chocada, eu vi representação e também vi uma história interessante. E no final é isso que importa. Para mim, se você quiser ler o livro vá e leia, tire as suas próprias conclusões e não deixe resenhas e comentários te influenciar.
"Two aching, broken hearts that felt painful enough to eclipse the whole world"