A literatura brasileira esta repleta de obras em prosa romanceando acontecimentos históricos. Desde a viagem de Cabral e o estabelecimento dos primeiros colonos nesta terra, até ficções sobre fatos recentes, como os governos militares, ha inúmeros romances e contos. Mas são poucas as obras poéticas que se arriscam a semelhante tarefa. Uma das exceções, e por certo a mais brilhante, e o Romanceiro da Inconfidência, iluminado pela poesia altíssima de Cecília Meireles.
O poema (na verdade formado por vários poemas que também podem ser lidos isoladamente) recria os dias repletos de angustias e esperanças do final da década de 1780, em que um grupo de intelectuais mineiros sonhou se libertar do domínio colonial português e do desastre que se abateu sobre as suas vidas e a de seus familiares. Utilizando a técnica ibérica dos romances populares, atenta aos autos do processo, as cartas, aos testamentos, a pintura, as modinhas, as estatuas dos profetas de Aleijadinho, a poeta recria com intensa beleza o cotidiano, os conflitos e os anseios daquele grupo de sonhadores. Diante dos olhos do leitor surgem as figuras de Tomas Antonio Gonzaga, o apaixonado de Marília, a bela, Claudio Manuel da Costa, Barbara Eliodora e, se sobressaindo sobre todos, o perfil impressionista de Tiradentes, retratado como um Cristo revolucionário, tal a imagem que se modelou a partir do século XIX e se impôs ate nossos dias.
A idealização preenche lacunas históricas e enriquece o poema. Como observa Alberto da Costa e Silva no prefacio, "com a imaginação a adivinhar o que não se mostra claro ou não esta nos documentos, Cecília Meireles recria poeticamente um pedaço de tempo e, ao lhe reescrever poeticamente a historia, da a uma conspiração revolucionaria de poetas, num rincão montanhoso do Império português, a consistência do mito".
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