Marcel Koury 28/05/2021
"(...) Eles percorriam as ruas juntos, sacando tudo com aquele jeito que tinham nesses primeiros anos, e que mais tarde se tornaria mais amargurado, penetrante e vazio. Mas, nessa época, eles dançavam pelas ruas como piões frenéticos, e eu me arrastava na mesma direção como tenho feito toda a minha vida, sempre rastejando atrás de pessoas que me interessam, porque, para mim, pessoas mesmo são os loucos, os que estão loucos para viver, loucos para falar, loucos para serem salvos, que querem tudo ao mesmo tempo, aqueles que nunca bocejam e jamais dizem coisas comuns, mas queimam, queimam, queimam como fabulosos fogos de artifício, explodindo como constelações em cujo centro fervilhante — pop — pode-se ver um brilho azul e intenso até que todos 'aaaaaaah!'. (...)"
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A Geração Beat foi um movimento literário que surgiu da vanguardista visão de um grupo de amigos escritores que se conheceram no final de 1944 no West End Bar, em Manhattan, Nova York, dentre eles, Jack Kerouac (1922–1969), Allen Ginsberg (1926–1997) e William S. Burroughs (1914–1997), que, juntos, erigiram um fenômeno cultural que revolucionou a literatura estadunidense.
Para a intelligentsia da época, os beats eram apenas um grupo de jovens antissociais, mas havia um porquê: o termo "beat", cunhado por eles mesmos, significava "derrotado e/ou marginalizado", e incorporava uma contundente atitude de protesto e rebeldia contra a sociedade convencional, que eles, boêmios hedonistas que celebravam o inconformismo e a criatividade espontânea, consideravam absurdamente retrógrada e hipócrita.
Em "On the Road", publicado em 1957, Kerouac cria um novo tipo de prosa poética, que funciona como uma "trilha sonora interna"; um fluxo de consciência free-jazzístico (a música foi de basilar importância para o despertar da consciência cultural do autor), que vai se desvencilhando das palavras e, por conseguinte, das frases e, por extensão, dos blocos de texto, trazendo a linguagem e o ritmo das ruas, mesclando, num anarquismo místico, realidade e onirismo, suplantando o descrédito promovido por burocráticos críticos literários e acinzentadas celebridades acadêmicas (certa vez, questionado sobre o que achava da prolixidade beat, o escritor Truman Capote, outro transgressor da escrita, respondeu de maneira ácida: "Isso não é escrita, é datilografia"), transformando o que era inicialmente aventurescas viagens de carro, entre 1947 e 1950, por todo o território dos Estados Unidos e pelo norte do México, numa busca — com iluminada influência do budismo — por transcendência espiritual.