Felipe 25/10/2012
Definido de forma rápida, poderíamos dizer que o romance de Jane Austen é uma dolorosa exposição da insolúvel problemática do grande abismo que existe entre os desejos íntimos e a sociedade. As duas protagonistas do primeiro livro de Austen são personagens exemplares e contrastantes dentro de uma sociedade regida exclusivamente pelo poder pecuniário sobre as ações dos indivíduos e pela degradante consciência moral dos mesmos. Austen é mordaz e silenciosa em suas críticas e expõe de forma soberba as contradições de seu mundo, efetuando em suas personagens verdadeiras vivisseções, colocando o caráter e as ações em tubos de ensaio para melhor visualizar e obter êxito em sua velada, porém rasante, crítica de costumes.
Elinor e Marianne, as duas representantes do título do livro, são as fabulosas heroínas com seus respectivos brasões: Elinor é a razão, a afabilidade, a inteligência brilhante e filosófica; Marianne é a sensibilidade, a sinceridade, a pulsão avassaladora para sentir de forma extrema todos os seus pensamentos. Juntas constroem a dialética do esclarecimento deste romance, pois aqui, como em Shakespeare, os personagens se revelam através da palavra. É a palavra, o diálogo, o íntimo verbal de cada um que irá definir os rumos da história.
Jane Austen é realmente uma escritora de gênio, dotada de um talento explícito para sondar psicologicamente os rumos de sua esplendorosa prosa. Ela é a união entre o que há de melhor dos moralistas franceses e da fantástica herança das letras anglo-saxãs, que encontram em Shakespeare o seu arauto maior. Por vezes não compreendida, Jane Austen se passa, entre as mentes menos perceptivas, como uma simples narradora de bailes e de chás da tarde, mas, por trás daquela aparente inocência, encontramos uma visão de mundo extremamente lúcida e nada complacente com os vícios de seu tempo.