Queria Estar Lendo 05/12/2018
Resenha: Máquinas Mortais
Máquinas Mortais, do autor Philip Reeve, está ganhando uma nova edição aqui no Brasil pela HarperCollins. O livro é uma mistura de distopia e steampunk e apresenta um mundo onde as cidades não permanecem mais no lugar, elas se movem sobre rodas - e são uma ameaça umas às outras.
Na história, uma guerra gigantesca devastou o mundo - a Guerra dos Sessenta Minutos - e milênios se passaram. Agora, a ordem natural das coisas se dá através de caçadas, cidades devorando cidades. A mais forte se torna uma ameaça, as menores precisam acelerar para fugir. Dentro de Londres, Tom crê que vive em uma das mais majestosas e brilhantes criações do homem; uma cidade-tração que é ameaça e sonho para muitas pessoas.
Quando um incidente com o seu ídolo, Valentine, o maior arqueólogo de Londres, coloca Tom no caminho de uma assassina em busca de vingança, tudo em que ele acreditava é posto à prova: a glória das cidades-tração e da ordem estabelecida entre elas e até onde os homens vão para sustentar esse poder, para devorar tudo e todos.
Máquinas Mortais foi, sem sombra de dúvidas, uma das minhas maiores surpresas do ano - positivamente falando. A história de Philip tem um ritmo bem estabelecido, personagens bastante amigáveis e fáceis de se relacionar e um universo fascinante.
Tom, por ser um protagonista, poderia ter caído facilmente naquele esteriótipo de paspalho chato - e eu nem teria considerado ruim, uma vez que já estou acostumada com isso -, mas ele foge. De garoto sonhador com a grandeza para sobrevivente, Tom aprende a encarar o mundo, o estático e o de tração, com outros olhos. Aprende que as histórias contadas têm muitas verdades, e que sua relação com Londres talvez estivesse do lado errado do tabuleiro.
O garoto curioso vivencia muito além da cidade-tração graças ao incidente com a assassina - Hester Shaw aparece de supetão em Londres e tudo que Tom entende é que ela quer matar Valentine; o motivo se torna parte do arco da personagem, seu desenvolvimento de coadjuvante para uma das peças principais da história.
Hester Shaw é uma figura misteriosa, envolta em rancor e desejo de vingança - mas é também uma garota sozinha e perdida que não tem muito a almejar além do coração do homem que arruinou sua vida. Toda a história dela e de Valentine foi bem encaixada na trama, os motivos que guiaram ambos os personagens a fazerem o que fizeram me convenceram e me deixaram ansiosa por mais respostas; é o tipo de arco que dá emoção à trama, mais do que apenas fugir e se correr - como Tom e ela precisam fazer.
Valentine, para minha surpresa, não foi um arquétipo típico de vilão; ele com certeza não é um herói, mas também não carrega toda uma aura maléfica e cruel. Ele é um estudioso que talvez tenha feito a descoberta de uma vida ou talvez tenha cometido um erro. Seu arco é mais rápido na trama, mas é movido pela família, por querer poder e ao mesmo tempo perceber o quanto isso é nocivo.
E por falar em família, chegamos à quarta peça importante dessa história: Katherine. Filha adotiva de Valentine, é uma garota em sua perfeita zona de conforto que não tem muito a questionar sobre a vida e sobre o pai - até que começa a questionar tudo. De madame para investigadora, eu fiquei fascinada pela sua evolução e por como ela sustentou a personalidade frágil e delicada mesmo em seus momentos de maior coragem.
Além deles, figuras como Anna Fang, o historiador Pomeroy, Shrike, o aprendiz Pod e muitos outros personagens enriquecem a trama principal, servindo de suporte para a história se desenvolver e ganhar seus momentos de tensão e de evolução.
"Era natural que cidades comessem vilas, assim como as vilas comiam vilarejos, e vilarejos pegavam pequenos assentamentos. Isso era Darwinismo Municipal, e esse era o jeito que o mundo funcionava há mil anos."
O universo criado pelo autor é de uma genialidade difícil de explicar; Philip estabelece esse mundo onde as cidades viajam a quilômetros por hora com seus milhares de habitantes a bordo, onde o "Darwinismo Municipal" é a ordem natural das coisas - "é devorar ou ser devorado" no sentido mais literal. Imaginar esse cenário, as torres e construções da cidade perseguindo outra, os dirigíveis lotando os céus.
Além dessa tecnologia avançada, mas nem tanto assim, temos flashes de invenções do período da Guerra, ciborgues reanimados que caçam pessoas e armas de destruição em massa que poderiam se tornar o fim das cidades-tração caso caiam nas mãos erradas.
Usando uma narrativa ora pausada e explicativa e ora carregada em adrenalina, o autor entrega um livro que vale a pena conferir - e com um final fechadinho dentro da sua proposta. A série tem continuação, mas a aventura principal de Máquinas Mortais começa e termina dentro desta obra.
"Ele estava cansado de ser varrido de um lado para o outro pelo mundo por planos de outras pessoas."
A edição da HarperCollins ficou a coisa mais linda do mundo - eu amo e venero essa capa, a diagramação tá bem encaixadinha na proposta da série e não passei por nenhum erro de revisão durante a leitura.
Máquinas Mortais é uma boa pedida se você gosta de perseguições e mistérios ancestrais; uma leitura cheia de reviravoltas e personagens bem construídos que não vai deixar que você largue o livro até terminar.
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