Virgilio_Luna 16/09/2020
Pensando aspectos de nosso tempo, com adaptação
Antes de iniciar meus pensamentos sobre a obra, gostaria de aliar-me a Deleuze: podemos pegar um filósofo do passado, o seu canto, os seus problemas, e trazê-lo ao presente - esta obra é um convite a pensarmos a política e o Estado de forma mais madura.
Há dois prefácios. Um deles de Leandro Karnal, o qual é bom. O outro, no entanto, aprofunda nos dados historiográficos da obra de La Boétie, falando até mesmo de sua amizade com Montaigne, a reedições de sua pequena obra, o seu pensamento político e sua paixão irremediável pela liberdade.
O texto de La Boétie nos convida a fazer uma suspeita, uma pergunta: Se todos os animais, na Natureza, gritam pela liberdade, o que faz que um homem tolere os abusos de um tirano, de um homem só, com duas mãos, duas pernas, dois olhos, uma boca e duas orelhas? O que faz com que esse tirano saqueie nações, surrupie famílias... Como é possível? Resumindo: como um tirano faz o que faz e, ainda assim, é tolerado pelo povo?
La Boétie nos aponta caminhos para pensarmos isso. O primeiro deles é o costume, um velho argumento, aquele povo já está tão acostumado a viver de tal forma que acha que não há mais nada no mundo, a única possibilidade é aquela - o que, nem de longe, diminui a tragédia, só a amplifica.
O segundo remete às artimanhas do tirano: usando exemplos históricos, Boétie nos lembra de Ciro, que tinha poder sobre a Lídia, a qual, após tentar se revoltar contra ele, sofreu uma repreensão: Ciro mandou que abrissem bordéis na cidade. Os bordéis, o panis et circensis, diluem o povo, deixam-no embriagado, incapaz de agir e de pensar - fazem, inclusive, com que amem o tirano, ora, um homem que nos dá bebidas e festas deve ser um homem bom! Mas o dinheiro das festas, das bebidas, é o mesmo que o tirano surrupiou, que ele roubou de seus cidadãos.
O terceiro, e último, é olharmos que um tirano tem cinco ou seis apoiadores centrais, homens de amplo poder que se beneficiam do governo tirânico. Esses cinco ou seis têm cerca de 600 homens, cada um, que se beneficiam de suas práticas, recebendo cargos públicos. Esses 600, por sua vez, possuem, cada um, 10mil, 100mil homens sob o seu poder. O tirano é um guarda-chuva de tirania: ele cria o próprio habitat do ódio, a sua possibilidade de repreensão. Usando a imagem de Jupiter, podemos dizer que ele é o vértice com vários fios se distanciando, isso ao lado dos outros 6, que dão o nó na ponta.