Sísifo Contemporânea 21/07/2020
Engraçado como os melhores livros que eu já li na minha vida aparecem de formas aleatórias, não é surpresa pra ninguém que uma das mais novas músicas do Harry Styles faz uma referência a este livro, mas apenas em seu nome mesmo, a música não tem muito a ver com a história por trás de Açucar de Melancia, eu como fã do trabalho de Harry decidi ler a obra que de certa forma inspirou a música.
O livro de inicio me fez me sentir confusa, porém intrigada, à medida que fui avançando menos as coisas faziam sentido mas ao mesmo tempo tudo ia sendo visualizado de uma forma muito cristalina por mim, então de certa maneira era uma falta de sentido que fazia sentido? Não sei, só sei que ao fim da leitura eu estava extasiada.
O livro, apesar de não ser o seu propósito, traz uma ironia entre os elementos que compõe a obra, tudo em euMORTE tem como base o açúcar extraído das melancias, e em alguns momentos o personagem principal - que vale ressaltar, não revela o seu nome, provocando a sensação de que essa é a tentativa do autor de falar sobre si de uma forma direta-, acaba citando sobre cheiros doces, gostos, cores vibrantes, o que acaba ressaltando que aparentemente é um lugar dinâmico, vibrante, alegre, em contraste com a aparente apatia de quase todos os personagens, especialmente em nosso narrador/personagem principal. Apesar do ambiente favorável traz uma atmosfera sufocante, assim como a crescente agonia em relação a alguns acontecimentos da história, o uso irrefreável de uma máscara de felicidade mecânica, onde o mundo se acabando aos seus pés mas que é preferível fingir que o problema não está ali a encarar ele de verdade, o esquecimento neste livro, é supervalorizado (e aqui trago um mini SPOILER!!!!!!!) como quando uma determinada personagem morre e ao final do seu funeral eles usam tijolos (feitos de açúcar e aparentemente ocos por não emitirem sons) para fechar o cômodo que ela costumava viver, de modo que selasse ali, toda existência (tudo que era dessa personagem estava ali guardado) e memória do que um dia foi pertencido.
Já ao final do livro, nós temos um Posfácio, nos contando parte da vida de Richard Brautigan, o que contextualizando à sua obra, percebemos em Açúcar de Melancia uma metáfora para as perdas, a depressão e a exigência de um estar bem quando não se está.
Richard usa, em determinado momento, a figura do tigre, como ameaçador, perigoso, agressivo, mas também inteligente e sedutor, simbolizando uma força que mesmo desconfortável é vital, pois é através dela que encaramos o que possuimos de mais primitivo, nos privar disso, é nos privar da noção de perda, do acesso à algumas emoções para que possamos seguir em frente. Gosto de pensar que a figura do tigre nesta obra vem justamente para sinalizar a perda de Richard ao acesso às suas próprias emoções sinalizadas na apatia do personagem e na falta de rumo do mesmo, numa tentativa de selar "as coisas esquecidas para sempre", provocando no futuro o suicídio do mesmo.
É um livro que, apesar de curto e de rápida leitura, tem um ritmo dificil de digerir, é sufocante, é bizarro, não faz aparente sentido até parar pra refletir sobre o mesmo, o livro tem 239 páginas em letras enormes e capítulos tão curtos que chega a ser risível, mas me foi necessário quase um mês de uma leitura devagar pra poder conseguir apreciar, essa obra não é uma obra fácil, mas ainda assim, eu recomendo, um dos melhores que já li.