Marcos Pinto 22/03/2016Não queira ficar sem lerEu tenho que concordar com Harlan Coben: sim, esse livro é de roer as unhas. Nunca tinha lido nada da Lisa Jackson e me arrependo profundamente de ter começado tão tarde. Porém, comecei a desbravar a escrita da autora muito bem; Não queira saber me ganhou de forma instantânea. Os motivos? Venha conferir.
Ava é uma mulher bem-sucedida, poderosa e rica. Aliás, ela continua rica, porém os dois adjetivos primeiros acabaram se perdendo desde que tudo aconteceu. Esse “tudo” foi o inexplicável sumiço do filho de Ava. Em uma festa, com diversos presentes, a criança sumiu sem deixar rastros. Ele estava na cama dormindo e simplesmente desapareceu. Ninguém viu, ninguém sabe de nada; ou melhor, isso é o que todos alegam.
Desde o ocorrido, Ava praticamente enlouqueceu. Ela vê coisas que não existem, ouve vozes irreais e tem pesadelos aterradores. Depois de frequentar hospitais, ela acaba voltando para casa, mas tudo ainda parece persistir. Porém, dia após dia, Ava vai demonstrando certa melhora e começa a desconfiar de todos ao seu redor. Estranhamente, todos eles parecem saber de coisas que ela não sabe; pior, parecem manter segredos, fazer conspirações. Será isso apenas imaginação ou verdade? Alucinação ou verdades? Isso é o que você e Ava precisam descobrir.
“– Sem problema. – Mas os olhos dele se fixaram nos dela, e Ava percebeu que os dois estavam mentindo. Ela detestava ser tão submissa, mas sabia que precisava agir com cuidado ou acabaria ficando em observação num hospital, tento a estabilidade mental questionada. De novo” (p. 26).
Partindo dessa premissa, Lisa Jackson cria um enredo simplesmente sensacional e quase inigualável. Isso se dá por causa do forte apelo psicológico que a autora trabalha na obra. Enquanto na maior parte das obras policiais o grande mistério é apenas o assassino, aqui temos muito mais. É necessário entender a mente de Ava e das pessoas ao seu redor, seus medos e suas ânsias; e suas razões para cometer as múltiplas possibilidades que podem ter acontecido com a criança. Ademais, precisamos descobrir se tudo não foi simples acaso ou uma conspiração. Descobrir mentiras quando a narração é feita com foco em alguém que não está controlando totalmente suas faculdades mentais é simplesmente genial.
Outro ponto que merece ser destacado é a autora ter conseguido trabalhar tudo isso de maneira que a narrativa ainda ficasse ágil e eletrizante. No começo, a autora prende o leitor na ambientação, fazendo-o que ele comece a desconfiar de Ava e de todos os personagens. Quando a ação começa, tudo fica ainda mais ágil e torna-se praticamente impossível largar a obra. A autora sabe como fisgar o leitor até nos momentos onde nada acontece.
Outro fator que contribui para o sucesso da obra é a ausência de heróis. No livro, não temos nenhum policial salvador da pátria. Isso torna a obra mais real, afinal, é muito mais fácil nos identificarmos com uma mãe desesperada do que com um policial “linha dura” que procura por provas.
“Talvez todos os membros da família que a consideravam maluca tivessem razão. Havia grandes chances de ela ser louca de pedra” (p. 40).
Além do ponto anterior, outro fator que faz com que o leitor se aproxime do enredo é a excelente construção dos personagens. Ava é uma mulher sofrida, perturbada e talvez um pouco louca. A autora consegue trabalhar cada aspecto dela de forma que se torne cada vez mais humana e real. Outros personagens da obra, como o Wyatt, marido da protagonista, também recebem esse tratamento especial da autora. Contudo, como já dito, a obra é narrada com foco principal em Ava, então todos os demais personagens são vistos como ela os vê, o que pode enganar o leitor.
Quanto à parte física, também não tenho reclamações. A capa está simplesmente maravilhosa: sombria e com um pouco de mistério, o que combina perfeitamente com o enredo. A diagramação, por sua vez, é bem simples, mas confortável. As folhas são brancas, mas como as letras possuem um bom tamanho e o espaçamento é ideal, não prejudica em nada a leitura. A revisão e tradução também foram bem feitas.
Com base em todos esses aspectos, com certeza eu indico Não queira saber. Seja você fã de livros de mistério ou não, certamente irá gostar dessa obra, pois o lado emocional e psicológico foi muito bem explorado. Só deixo um aviso prévio: não confie em ninguém.
“É para isso que serve a família, sabia? Para amar até a morte, só que arrancando o coração da gente no caminho” (p. 225).
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http://www.desbravadordemundos.com.br/2016/03/resenha-nao-queira-saber.html