Euflauzino 24/05/2017A megalomania de um vilão quase imortal
É difícil resenhar livros de séries sem soltar algum spoiler. Então, só para relembrar sobre a trama: Após a detonação de uma bomba alienígena contendo um vírus (qualquer semelhança com o “agente laranja” parece não ser mera coincidência), parte considerável da população é dizimada. Uma parcela dos sobreviventes é afetada. Alguns recebem habilidades físicas ou mentais e são chamados de ases, outros sofrem transformações grotescas e tornam-se coringas. Ases e curingas vivem em constante conflito e no meio deste conflito encontram-se os limpos (que não foram afetados pelo vírus) e alguns alienígenas.
O Astrônomo é o grande vilão de Apostas mortais: Wild Cards – Livro 3 (Leya, 400 páginas) e talvez da série toda. Prometeu vingança ao grupo que desmantelou sua gangue de maçons e não descansará enquanto não se der por satisfeito. Comanda sacrifício de jovens mulheres para ganhar maiores níveis de energia e controlar um arsenal de habilidades que o deixam à beira da imortalidade.
“— Sabe que dia é hoje?
— Dia do Carta Selvagem. Todo mundo sabe disso. — Spector pegou as calças de veludo cotelê do chão.
— Sim, mas também é outra coisa. O Dia do Juízo Final. — O Astrônomo entrelaçou os dedos.
— Dia do Juízo Final? — Ele vestiu as calças. — Do que você está falando?
— Daqueles desgraçados que arruinaram meu plano. Intervieram em nosso verdadeiro destino. Impediram que dominássemos o mundo. — Os olhos do Astrônomo reluziam. Havia uma loucura neles que nem mesmo Spector tinha visto antes. — Mas há outros mundos. Este aqui não esquecerá tão cedo do meu tiro de misericórdia nos malditos que ficaram no meu caminho.”
Para alcançar seus objetivos o Astrônomo obrigará alguns asseclas arrependidos a tomarem partido nesta empreitada. Passa a amedrontar Spector (pode matar apenas com o olhar), e a incitar o ódio que Roleta (envenena o parceiro durante o sexo) carrega por Dr.Tachyon, afinal muitos o culpam por serem como são, querem vingança e só vão sossegar com o alienígena morto.
“— Ah, minha preciosa. É assim que você se esconde de sua alma? Minha pequena tola. Você deveria abraçar o ódio, lambê-lo, comê-lo, deleitar-se com ele. Estou lhe oferecendo uma oportunidade única de vingança. Para retribuir a perda com dor...
... E o fluxo de memória voltou. A coisa deformada nojenta que jazia entre suas pernas. O resultado líquido de tantas horas de parto doloroso. Um monstro tão grotesco que até mesmo as enfermeiras odiaram tocá-lo.”
Como podem perceber, “vingança” está no prato do dia. Entre os componentes do grupo que enfrentou o Astrônomo temos Fortunato (amplia seus poderes através do prazer). Provavelmente é o único com poder para equiparar-se com o vilão.
“Fortunato sentiu as pernas saírem do chão e dobrarem-se em posição de lótus. Os dedões tocaram os indicadores e pousaram sobre os joelhos. Ele sentiu como se o orgasmo final... ainda estivesse acontecendo. Quando ela o abraçou e lançou o poder de volta para dentro dele, foi como explodir em átomos e se reunir com o universo inteiro dentro dele. Sentia-se como o centro do sol, com as labaredas de energia saindo dele de forma incontrolável. Sentia como se nunca fosse acabar.”
Nos primeiros dois romances o universo de Wild Cards foi sendo criado, o mosaico ia se expandindo inúmeras vezes, as histórias se tocavam em alguns pontos, mas também se afastavam. Neste já podemos notar a convergência, as inúmeras conexões se confundindo como uma rede neural. Gostei mais, pois agora se tornou uma história única com vários envolvidos. Cada capítulo é uma determinada hora do dia e o desenrolar da trama acontece em 24 horas – mortes, revelações, conflitos, guerra.
Lembrando que a saga se iniciou nos anos 80, é impossível não compará-la às HQs de heróis da Marvel e da DC, que parecem quase pueris comparados a esta. Sou capaz de imaginar o rebuliço causado dentro das redações e departamentos de criação ao notar o sucesso de Wild Cards. Esta mudança de paradigma, alteração para uma temática voltada ao público adulto, redundaria em “Watchmen” do mago Alan Moore. Mas aí já é outra história.
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