Laura 05/01/2014
Africanismo?
Faz tempo que estou procurando autores brasileiros contemporâneos, novos, principalmente de ficção. Quando vi "Deuses de dois mundos" pairando no Facebook, me animei. Me animei ainda mais quando, ao ler uma amostra dos três primeiros capítulos, o negócio me pareceu bom. Comprei logo a versão capa dura, bonita, papel bom. Não demorou muito para, entre uma estação de metrô e outra, as páginas correrem e o livro acabar rapidinho, me deixando uma sensação de... Espera. Vamos aos fatos.
O livro é dividido em duas "frentes", com capítulos alternados. A primeira é do adivinho Orunmilá, que perdeu seus poderes. Com seu auxiliar, Exu, ele que parte em uma busca por bravos guerreiros dispostos a ajudá-lo. A segunda é do repórter Newton, que relata sua história para um desconhecido em busca de compreensão. Claro que, ao final, revela-se uma conexão entre as duas (mas não sou eu que vou contar).
Logo de cara, me deparei com um problema: não sei nada dessa mitologia - e o autor parece nem ligar, despejando uma infinidade de nomes sem se dar o trabalho de explicar. Toda vez que me deparava com um desses, era obrigada a parar, pensar, lembrar. Não que isso seja ruim, mas atrapalhou um pouco o fluxo da leitura.
Outro problema veio da parte de New. Nossa, que cara chato! Fui obrigada a rir quando, lendo os agradecimentos ao final, descobri que, segundo o próprio autor, o personagem era bem mais insuportável antes. Hein? Tem como ser mais prepotente, elitista e machista? Eu acho que não!
Meu último problema tem a ver com o final (não vou contar detalhes, só falar sobre a estrutura mesmo), que é um final aberto. Ou melhor, não é um final aberto, já que o livro não se conclui e não aponta para nenhuma conclusão possível. Eu já vi uma infinidade de finais abertos, e esse me pareceu simplesmente um corte na história. Como se o autor tivesse feito um manuscrito só e pensado "hmmm, se eu cortar minha história em três partes, posso fazer três livros e vender mais!" E essa sensação só piorou quando descobri a origem publicitária do nosso querido PJ Pereira.
O que me leva a mais uma impressão geral: que o autor aproveitou o sucesso de livros baseados em mitologia (Percy Jackson, cof) com mais a maior visibilidade da africanidade no nosso país (instituída pelos PCNs no geral) e juntou os dois para fazer esse livro. Mais depois, vi que o livro foi escrito há dez anos atrás e lançado só agora, ou seja... Ele não juntou os dois para fazer o livro, mas sim para finalmente lança-lo, isso sim.
De qualquer jeito, não achem que sou só ressalvas. O livro é bem escrito, nos faz querer continuar lendo. Vou comprar a continuação, sim, quero saber o que acontece depois. Além disso, é legal ver que, não só a cultura africana não está sendo negada, como também que ainda existem escritores brasileiros dispostos a inovar. Espero fortemente que o sucesso de vendas desse livro inspire a vinda de outros, e que nós tenhamos mais livros próprios para ler. Recomendo que vocês vejam com seus próprios olhos.