Bruno Oliveira 01/09/2014Viver simplesmenteSolanin, manga de dois volumes assinado por Inio Asano, não tem emoções fortes, nem mesmo uma trama poderosa, aliás, qualquer tentativa de escrever uma sinopse a seu respeito incorre no risco de desanimar o leitor, uma vez que ela anunciará uma história preenchida com personagens e conflitos que bem pouco impactam aquele que a lê. Afinal, qual de nós quer saber de personagens que não são excepcionalmente únicos, que não passam por fardos pesados demais e tampouco tem um grande destino por percorrer? Quem deseja observar as existências simples e chatinhas de jovens que não representam uma juventude idealizada, reflexo de propagandas e de imagens da cultura pop? Quem quer saber da vida?
Todos nós?
A bem dizer, a história é a seguinte: o casal Meiko e Naruo cuida de sua vidinha pós-universitária, o que envolve pagar contas, divertir-se de vez em quando, tocar numa banda, fazer um pouco de sexo, planejar o dia, brigar, fazer as pazes, pensar no futuro, aborrecer-se com o trabalho, e… É só. O mangá segue esse ritmo cotidiano, retratando a passagem de um dia para o outro com aquela mesma naturalidade com a qual o sol vai do leste ao oeste, na verdade, é justamente por conta dessa absoluta normalidade que ele consegue ser cativante e original. Acompanhando as vidas sem graça de Meiko e Naruo, o leitor se identifica com a pequenez dos protagonistas e sente que, entre suas esperanças e egoísmos, também vive com pouco e costuma ser feliz com muito menos do que acredita precisar.
Ao se despir dos muitos apelos – comerciais ou ideológicos – que associamos ao mundo jovem, Solanin abandona as várias camadas de superfluidade com as quais nos vestimos e expõe a humanidade escondida ali, construindo uma história verosímil e melancólica que poderia ser a de qualquer um.
Em poucas palavras, pode-se dizer que o tema da obra seja o amadurecimento. É sobre crescer, ter expectativas quanto a si mesmo e quanto ao mundo; mas ao mesmo tempo sobre ser, gradativamente, forçado à modéstia em relação a elas porque o mundo pode ser pouco generoso; é sobre se descobrir apenas “talentosinho”, pouco bonito, limitado, sem um futuro brilhante, comum e nada mais que isso – mas precisamos de mais que isso?
A história quase não propõe reviravoltas mirabolantes, frases de efeito ou estímulos intensos que mantenham o leitor sempre entorpecido e embotado, sedento por uma nova injeção de surpresa. Há páginas e mais páginas de silêncios, de momentos a respeito dos quais nada precisa ser dito, em que os personagens apenas existem sem que haja outro sentido para a vida senão viver. Deste modo, ainda que não pretenda ir muito longe, a trama não perde o ritmo e não fica parada: não há ápice nem momento de banalidade, apenas o curso regular dos acontecimentos.
Nestes tempos em que estamos constantemente submetidos à estímulos de todo tipo e que devemos corresponder à expectativas no amor, nas amizades, no trabalho e em todo o resto, Solanin nos leva a aproveitar o tédio, à desconhecer o estado do mundo, à não ler, à não saber da política, à caminhar sem ter em mãos fones de ouvidos. Perder-se sem perspectiva de encontro e descobrir que a vida é tão simples que machuca. Trata-se de uma leitura leve e ensolarada a qual não obscurece seus dramas para que pareçam mais profundos, mas os ilumina até que se tornem evidentes em toda a importância que tem, com isso, merece toda a visibilidade que tenho tem a oferecer: leiam e sejam felizes.
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