Nati Pesciotta 02/09/2015
Não é literatura, é a vida que interessa
Acabar o livro de crônicas do Sergio Vaz dá uma certa tristeza. É como se alguém vai embora quando a conversa ainda está boa. Dá vontade de ficar mais com a dignidade que o poeta esbanja. Tem muito amor e muita raiva na medida certa nos textos dele, por isso eles têm força e funcionam. Ele mesmo define: "Escrevo ora com um sorriso no rosto, ora com uma pedra na mão". Além do autor escrever bem e com fluidez, as crônicas chamam atenção por abrir as portas da rua para a literatura. Por quantos séculos as crônicas sobre a própria vida falaram de flores, saias, mares? Sergio Vaz fala de amor também, mas dos personagens dos bairros, dos romances da periferia, da elegância discreta de Taboão da Serra. Não esquece também da tristeza, da revolta e da desilusão, que pode ser por um amor perdido ou pelo campinho da infância ter virado um cemitério.
Minhas partes preferidas do livro são as que descrevem pessoas reais da vida real, como uma vendedora do escadão, um professor da infância, a primeira ida ao estádio, um amigo feito num enterro. Também valem muito a pena as narrações tocantes de Sérgio sobre seu trabalho nas escolas, em que apresenta poesia e literatura para os jovens, e sobre o Sarau da Coperifa, que organiza sem arrogância alguma no Jardim São Luiz. "Dias em que a vida não dói", como ele diz.Tem um trecho dele que acho que resume tudo: "Os livros precisam ser profanados, as pessoas é que são sagradas. Não é literatura, é a vida que realmente nos interessa".
O autor dos textos é sem dúvida a mesma figura forte que vi no sarau da Coperifa, comandando a coisa com jeito e maestria, sem deixar ninguém de fora, mas também sem deixar ninguém de fora botar banca. Numa das crônicas, ele descreve uma pessoa que "tem o sorriso tão grande que sorri também pelas pessoas tristes". Eu diria que, nos textos dele, tem amor pela vida que ama também pelas pessoas desiludidas.