Ani 28/08/2016
Mais uma vez, a solidão.
Os amantes de livros que costumam se emocionar com as palavras dos autores, penetrar nas cenas e se afeiçoar aos personagens, dificilmente terminarão as primeiras páginas da 77ª edição Cem anos de solidão de Gabriel García Marquez, publicada pela Editora Record, sem encher os olhos de lágrimas.
O livro mal começa e o leitor se depara com “A solidão da América Latina”, discurso pronunciado por Gabriel García Marquez, em 21 de outubro de 1982, ao ser agraciado com o Prêmio Nobel de Literatura.
Os autores Ingleses, Franceses, Russos sempre foram conhecidos pelos principais clássicos da literatura mundial, antes de Gabriel García Marquez, possivelmente a identidade fantástica e surrealista da América Latina fosse desconhecida e, até mesmo desacreditada, especialmente na Europa, centro da cultura universal.
Em todo o seu discurso, mas especialmente neste trecho, Garcia Marquez esclarece, com muita humildade, que o preconceito sofrido pelos latinos, descende do desconhecimento e da incompreensão:
Eu me atrevo a pensar que esta realidade descomunal, e não só a sua expressão literária, que este ano mereceu a atenção da Academia Sueca de Letras. Uma realidade que não é a do papel, mas que vive conosco e determina cada instante de nossas incontáveis mortes cotidianas, e que sustenta um manancial de criação insaciável, pleno de desdita e de beleza, e do qual este colombiano errante e nostálgico não passa de uma cifra assinalada pela sorte. Poetas e mendigos, músicos e profetas, guerreiros e malandros, todos nós, criaturas daquela realidade desaforada, tivemos que pedir muito pouco à imaginação, porque para nós o maior desafio foi a insuficiência dos recursos convencionais para tornar nossa vida acreditável. Este é, amigos, o nó da nossa solidão.
Pois se estas dificuldades nos deixam - nós, que somos da sua essência - atordoados, não é difícil entender que os talentos racionais deste lado do mundo, extasiados na contemplação de suas próprias culturas, tenham ficado sem um método válido para nos interpretar. É compreensível que insistam em nos medir com a mesma vara com que se medem, sem recordar que os estragos da vida não são iguais para todos, e que a busca da identidade própria é tão árdua e sangrenta para nós como foi para eles. A interpretação da nossa realidade a partir de esquemas alheios só contribuiu para tornar-nos cada vez mais desconhecidos, cada vez menos livres, cada vez mais solitários.
Desse discurso, é impossível não brotar o interesse pelo ser humano Gabriel García Marquez, Colombiano, nascido em 1928, um dos maiores representantes do realismo mágico latino-americano, autor de diversos clássicos da literatura mundial, como o já citado Cem anos de solidão.
García Marquez também é conhecido pela beleza de sua retórica, que pode ser melhor explorada no livro “Eu não vim fazer um discurso”, que reúne na forma de texto vários dos discursos do autor como “A solidão da América Latina” dentre outros.