Palazo 23/11/2011A sétima arte costuma utilizar em muitos filmes a inspiração proveniente da literatura, ou como é mais chamada de adaptação para o cinema. Muitos livros ganham suas versões cinematográficas e geram discussões calorosas sobre a fidelidade do filme à obra literária, o elenco escolhido, a visão do diretor e outros aspectos que recaem sobre a mesma pergunta:
O filme superou a obra literária?
Agora imaginemos o contrario, a sétima arte adaptada para a literatura. Pois esta é a ideia do livro 24 letras por segundo, lançado pela Não Editora e organizado por Rodrigo Rosp. Dezessete escritores escolhem seus diretores preferidos e escrevem um conto baseado em um filme ou na obra cinematográfica do diretor.
As adaptações dos contos seguem linhas diversas na escrita de cada autor, porém em muitos deles é possível perceber traços marcantes de cada diretor. Como por exemplo, no conto “Um mar para Carmina”, de Monique Revillion, que demonstra com maestria todo o ambiente fantástico da cinematografia de Tim Burton, fazendo uma alusão clara ao filme Peixe grande, um dos meus favoritos.
No conto “Três Copos”, de Diego Grando, é perceptível nos detalhes o diretor Sylvain Chomet (As bicicletas de Belleville e O mágico). A falta de diálogos nos obriga a seguir cada gesto, ação e expressão dos personagens que não precisam da expressão verbal para demonstrar sentimentos, trejeitos ou ações no decorrer da narrativa.
Já o conto “Inquebrável”, de Juarez Guedes Cruz, mostra um ponto de vista diferente do filme “Corpo fechado” do diretor Night Shyamalan. Na história é apresentada a versão dos fatos pela mãe do homem de ossos de vidro, um relato tocante e que dá nova cor ao filme que tem no elenco Bruce Willis e Samuel L. Jackson.
Encontramos também contos que não precisavam de qualquer indicação de qual diretor inspiraram, devido ao estilo único de cada um e que é captado pelos escritores. É o caso do suspense “Visitas” de Samir Machado de Machado, o fantástico “O túmulo frio de Mimi Meyers” de Bernardo Moraes, os diálogos desnorteados de “Todos os homens dizem eu te amo” de Rodrigo Rosp e o inesperado “O paradigma do mexilhão” de Rafael Bán Jacobsen. Impossível não dizer que esses contos são inspirados respectivamente nas obras de Spielberg, Tarantino, Woody Allen e Almodóvar.
Dois contos merecem destaque especial. “No trânsito”, de Silvio Pilau, inspirado na obra de Kevin Smith, um hilariante diálogo entre três jovens em um texto construído em forma de roteiro. O outro é o conto de Bruno Mattos, “Se não ficares até o fim, eles te passam a perna” inspirado nos filmes de José Mojica Marins, conto que ganha naturalmente a voz do personagem Zé do Caixão – eu mesmo li alguns trechos em voz alta imitando o personagem, o que torna o conto muito mais interessante.
Além de todos os contos, vale destacar o design do livro que imita em todos os seus detalhes uma fita VHS, com selos, indicações de elenco e até detalhes no começo e final do livro. Isso sem falar nas informações que precedem cada conto sobre o autor e o cineasta. Detalhes estes que não podem passar batidos, e dão um toque todo especial a obra.
Sem dúvida este é um livro que encanta, seja pela identificação de cada diretor em um conto, pela descoberta de cineastas até então desconhecidos ao leitor, pela escrita de grandes escritores ou pelos fantásticos detalhes gráficos. Além do encantamento, a inversão de papéis ao adaptar filmes em contos abre um leque de discussões ás avessas propícia para boas conversas em torno de um questionamento:
Afinal, será que esses contos superam as obras cinematográficas?
24 letras por segundo
Organização: Rodrigo Rosp
Autores: Bernardo Moraes, Monique Revillion, Rodrigo Rosp (Org.), Juarez Guedes Cruz, Reginaldo Pujol Filho, Pena Cabreira, Pedro Gonzaga, Silvio Pilau, Milton Ribeiro, Eric Novello, Bruno Mattos, Diego Grando, Samir Machado de Machado, Antônio Xerxenesky, Rafael Bán Jacobsen, Victor Paes e Márcio-André
192 páginas
Preço sugerido: R$ 32,00