Janaina Edwiges 22/01/2022
A escravidão em Dom Casmurro!
Bom, gostaria de fazer um pequeno comentário sobre a representação da escravidão em Dom Casmurro, uma vez que já temos aqui no Skoob muitas análises literárias, bastante interessantes e ricas, sobre esta história genial. E convenhamos, não há como desvendarmos a maior dúvida da literatura brasileira. Se Capitu traiu ou não Bentinho, nunca saberemos. Afinal de contas, Bentinho, como excelente advogado, redigiu e nos apresentou uma perfeita tese de acusação contra a esposa, sem direito a defesa da outra parte.
Como nos ensina a Historiografia, a escravidão foi uma instituição social de trabalho compulsório, amparada por uma complexa estrutura legal e pelo costume oficializado, em que o escravizado era considerado uma mercadoria. Portanto, poderia ser vendido, alugado, doado, etc. Essa definição fica bem clara em uma das falas de Bentinho, sobre os escravizados pertencentes a sua família: "Não, alguns andam ganhando na rua, outros estão alugados. Não era possível ter todos em casa. Nem são todos os da rosa: a maior parte ficou lá". Essa fala também mostra a existência dos "escravos de ganho", que prestavam algum tipo de serviço ou realizavam algum trabalho na rua, devendo repassar parte dos ganhos aos seus proprietários. Mais um exemplo na narrativa: "Tínhamos chegado à janela; um preto, que, desde algum tempo, vinha apregoando cocadas, parou em frente e perguntou: - Sinhazinha, qué cocada hoje? - Não, respondeu Capitu. - Cocadinha tá boa. - Vá-se embora, replicou ela sem rispidez. - Dê cá! disse eu descendo o braço para receber duas".
Notamos que os escravizados em Dom Casmurro atuam bastante no âmbito doméstico, em um papel totalmente secundário, mesclados ao ambiente da história, como meros acessórios. O sistema escravista era plenamente aceito na época, portanto, não há em nenhum momento uma consciência moral dos personagens em relação a este regime, pelo contrário, para todos eles era plenamente natural uma pessoa ser considerada propriedade de outra, porque não se via o escravizado como pessoa, mas como um simples objeto. Tudo muito diferente do constrangimento e indignação que sentimos hoje, ao ler estas passagens.