@retratodaleitora 30/01/2016Denso, provocante, incrível "A guerra é muitas coisas ao mesmo tempo, mas é inútil querer fingir que não é excitante. É insanamente exitante. A maquinaria da guerra, o barulho que ela faz, a urgência de seu uso e as consequências de quase tudo que lhe diz respeito são as coisas mais exitantes que alguém que participa de uma guerra conhecerá na vida."
Sinopse: Durante quinze meses Sebastian Junger acompanhou um pelotão de infantaria do Exército dos Estados Unidos baseado numa remota área do Leste do Afeganistão. A intenção era ao mesmo tempo simples e ambiciosa: transmitir a experiência dos que lutam em um campo de batalha, contar como se sente quem participa de uma guerra. O autor dirigiu com Tim Hethertington o documentário Restrepo, vencedor do Grand Jury Prize no festival de Sundance, além de indicado ao Oscar 2011 na categoria documentário. Guerra descreve, com sagacidade e emoção, uma experiência de vida que há milênios tem sido um ritual destinado aos jovens e fortes: algo que poucos de nós, no conforto de nossas rotinas, realmente compreendemos, e que continua sendo uma prova definitiva de caráter.
Guerra é um livro de não-ficção onde o autor vai narrar sua experiência acompanhando um pelotão de infantaria guerreando no Afeganistão. Com muita propriedade, Sebastian nos narra o dia a dia dos soldados em meio ao risco iminente de morte; não só a deles próprios, mas de seus colegas. Ali, no fogo cruzado, são como uma grande família de homens dispostos a sacrificar a vida para salvar a de seus companheiros. Eles lutam juntos, sobrevivem juntos e permanecem unidos.
Sebastian não narra apenas dias "comuns" da vida deles ali. Como permanece com o pelotão durante muitos meses, presencia momentos de guerra; tensão, mortes e muita, muita dor. Além do tédio.
Sim, tédio.
Quando não estão matando ou sobrevivendo - ou esperando um ataque do outro lado - os soldados vivem o terror do tédio. O autor mesmo admite que, às vezes, o tédio era pior até que alguns tiroteios. Na verdade, quando já há muito não tinha combate, os soldados ansiavam - sim, eles ansiavam - por tiroteios. Para fazer o que foram fazer...
Segue um trecho sobre isso:
"O tédio é tão implacável que os homens desejam abertamente um ataque. Certa manhã, no calor de enlouquecer, o tenente Gillespie anda de um lado para o outro murmurando: "Por favor, Deus, traga-nos um tiroteio."
O autor dá um panorama bem legal sobre a guerra em si. Como funciona; por quê existe; as questões humanitárias, politicas e socioeconômicas... E, também, sobre o lado psicológico de tudo isso. Os soldados, como qualquer pessoa, sofrem com as perdas de seus amigos, com os ataques, com a saudade, com o dever... E isso só para começar! Resumindo: uma hora isso vai explodir.
O que acontece quando voltam para casa depois de meses acordando com barulho de bombas; lidando com o luto? Com os riscos? Tudo isso é explorado nesse livro. E as partes que envolvem mais psicologia e biologia foram, para mim, as mais intensas e interessantes.
"Quando dizem que sentem falta da guerra, não é que sintam falta de levar tiros - teriam que ser mentalmente perturbados para isso; sentem falta de estar num mundo em que tudo é importante e nada é certo. Sentem falta de estar num mundo em que as relações humanas dependem totalmente de sabermos se podemos confiar nossa vida à outra pessoa."
O livro se torna cem por cento mais forte quando nos damos conta de que tudo isso, TUDO, realmente aconteceu, e foi documentado. Esses homens que aprendemos a gostar/admirar - e precisamos nos despedir de alguns no decorrer do livro - realmente existiram. Eles viveram todo o trauma. É insano e ao mesmo tempo é incrível acompanhar a trajetória desses homens. Da vida em casa, antes da guerra, até o terror contínuo de uma batalha; e, depois, a continuidade desse terror quando voltam aos seus lares. Eles foram transformados durante a luta por algo que alguns deles nem sabiam o significado.
O livro é dividido em três partes: Medo, Matança e, por fim, Amor.
A primeira parte foi, para mim, a mais desafiadora de todo o livro. Por não ser muito entendida do assunto, fiquei perdida com alguns termos, nomenclaturas e etc. Porém, no decorrer, acabei acostumando com a forma que o autor escolheu para apresentar os fatos.
Ah! Em alguns momentos o humor no livro é tão forte que dei altas gargalhadas. Sim, tem humor. Nada explicito ou pedante. É o mais puro humor. Aquele que fazemos sem perceber. Frases e momentos improváveis e vergonhosos existem até na guerra, sim senhor.
"A disposição de morrer por outra pessoa é uma forma de amor que nem a religião é capaz de inspirar, e viver tal experiência modifica-nos profundamente. O que os sociólogos do Exército, com suas pranchetas, suas perguntas, suas infindáveis meta-análises, custaram a entender foi que coragem era amor. Na guerra, uma não existe sem o outro, e, em certo sentido, eram apenas maneiras diferentes de dizer a mesma coisa."
Essa foi uma leitura pesada, exigente, mas muito bem-vinda. O tipo de leitura que vai demorar até sair da memória; e talvez nunca saia de fato. Sebastian Junger foi corajoso, e agradeço por isso; por esse relato incrível.
A edição do livro está maravilhosa. A tradução, perfeita. Posso não ser especialista no assunto, mas sou entendida o suficiente para perceber quão belo foi o trabalho do tradutor, Berilo Vargas (revisão técnica por Joubert Brízida).
Leitura mais que indicada a todos (que tenham estômago forte e gostem do tema, pelo menos um pouco)!.
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http://umaleitoravoraz.blogspot.com.br/2016/01/resenha-guerra-de-sebastian-junger.html