Marina 05/08/2020
A energia nunca desaparece
O mais curioso desse livro é que ele não tem uma grande trama. A maioria dos capítulos são cenas e mais cenas do cotidiano dos protagonistas em Culver Creek: Miles se enturmando, o Coronel criando trotes... É um livro leve, bem teen, mas com reflexões muito maduras e significativas. O leitor precisa se esforçar para conseguir a resposta à pergunta: "Quem é você, Alasca?".
Claro que o protagonista se apaixona pela garota linda, inteligente, rebelde, misteriosa e madura. Mas Miles não enxerga Alasca de forma totalmente idealizada. Alasca é complicada, tem um passado triste, defeitos, um drama pessoal e motivos para agir da forma que age (e Miles sabe disso). Ao contrário do que acontece com outras "heroínas" de John Green (cofcofMargocofcof), conseguimos gostar dela.
?Sabe quem você ama,Gordo? Você ama a garota que faz você rir, que
vê filmes pornográficos e bebe com você. Mas não a garota tristonha, mal-humorada, maluca.
E ela tinha razão".
SPOILERS ;)
Porém, o mais valioso do livro são as reflexões em torno da morte. Desde a obsessão de Miles por últimas palavras, a angústia de Alasca por achar a saída do labirinto de sofrimento, a dor da perda, o arrependimento pelas más escolhas... É como se todo o drama de Alasca da primeira parte fosse uma introdução para o que viria a seguir. Com a morte dela, seja suicídio ou acidente, Miles, Chip, Takumi e Lara tiveram que passar pelo luto e refletir sobre o perdão, sobre a culpa, o sofrimento, a vida e a morte.
A redação final que os alunos deviam escrever, também trouxe um questionamento para os leitores:
"O que você ? você especificamente ? vai fazer para sair deste labirinto de
sofrimento? [...] Só quero saber como vocês vão
enquadrar em sua visão de mundo a presença incontestável do sofrimento e
como esperam navegar pela vida apesar disso".
E Miles pensa na importância do perdão para poder seguir em frente. Reflete sobre o arrependimento, a necessidade de aceitar a perda, de entender que nem tudo está em nosso controle, que devemos deixar ir... Só quem já perdeu alguém importante sabe o impacto do seguinte trecho:
"[...] que ela nos
perdoava, que tínhamos de perdoar para sobreviver no labirinto. Tantos de nós
teríamos de conviver com coisas feitas e deixadas de fazer naquele dia. Coisas
que terminaram mal, coisas que pareceram normais na hora, porque não
tínhamos como prever o futuro. Se ao menos conseguíssemos enxergar a infinita
cadeia de conseqüências que resulta das nossas pequenas decisões. Mas só
percebemos tarde demais, quando perceber é inútil".
Durante a vida, todos nós encontraremos Alascas. Pessoas que marcarão um antes e um depois (como na estrutura do livro). Um dos grandes questionamentos do ser humano é se há vida após a morte. Para muitos, é inconcebível pensar que tudo o que passamos na Terra não dê em nada, que seremos esquecidos, que tudo acaba aqui. Não temos como saber se há algo depois. Mas sabemos que todo ser humano é único.
O ser humano é energia. Energia que não se cria, nem se destrói. Ao morrer, nossa energia se transforma. Mas ainda estamos aqui. E o mais legal é que, enquanto existimos, somos feitos de energia que assumiu uma forma única e especial. Só por isso, já vale a pena estar vivo. Nossa vida é importante porque, mesmo que seja por um breve instante, cada um de nós, enquanto existirmos, somos únicos e irrepetíveis.
Não podemos voltar no tempo, nem recuperar aqueles que já se foram. Mas podemos celebrar a vida e as lembranças. Essa energia compartilhada entre você e aquele que se foi, jamais poderá desaparecer.
"Mas, para ser sincero, não acredito que ela fosse só matéria. O resto dela
também precisa ser reciclado. Hoje, acredito que somos mais do que a soma das
nossas partes. Se pegássemos seu código genético, suas experiências de vida, seus relacionamentos com outras pessoas e os enxertássemos num corpo do mesmo
tamanho e com as mesmas proporções, ainda assim não teríamos outra Alasca.
Existe algo mais. Uma parte que é maior do que a soma das suas partes
cognoscíveis. E essa parte tem de ir para algum lugar, pois não pode ser
destruída".