Julia 17/03/2017
Recomendo para todas as pessoas que gostam de uma boa história
Imagine um universo onde algumas pessoas, de uma determinada origem genética, possuam um “dom”, chamado de laran, que é capaz de lhes proporcionar “poderes” como: telepatia, presciência e voz de autoridade. Para desenvolver e aprimorar esse laran houveram programas de reprodução onde homens e mulheres eram selecionados minuciosamente para gerar descendentes fortes com o poder adequado.
Por conta desses programas de reprodução, os partos eram cada vez mais difíceis, o que acarretava, geralmente, na morte do bebê ou da mãe. Ainda somava-se o fato de que a criança que chegasse à vida adulta poderia morrer de uma “doença do limiar” (a transição da infância para a vida adulta). Em meio à tudo isso ainda existem reinos, soberanos e um sistema de “direito de nascimento”, o que para nós não é estranho. Significava que o rei precisa ter um filho homem legítimo para passar seus domínios, ou estará fadado ao caos.
Acredito que o livro “Rainha da Tempestade” fala mais de um universo e uma sociedade do que propriamente da vida pessoal de personagens. É um livro rico no que se trata de construir um ambiente fantástico: são carros voadores, reinos distantes, programas de reprodução, torres de monitoramento (onde, por sua vez, são construídas ferramentas e até mesmo armas de guerra ), um lago que é como um céu de peixes….
Mas eu diria, também, que o livro possui ao menos dois personagens principais, Dorilys Aldaran e Allart de Hastur. O livro carrega o título “Rainha da Tempestade” por causa de Dorilys e nós acompanhamos no livro, basicamente, a história dela, desde quase sua concepção. No entanto, acredito que Allart também é fundamental na trama, pois boa parte do livro é a vivência dos sofrimentos e incertezas dele.
Allart é o segundo filho de Lord Hastur, que é uma importante casa neste mundo. Ele tem um raro laran herdado de sua família, a presciência. O que difere Allart dos outros é o fato de que ele não apenas vê um único futuro, mas os múltiplos futuros possíveis. Isso quase o levou à loucura, pois, a cada passo que ele dava, poderia ver o que iria acontecer e o que poderia acontecer. Ele é um personagem cheio de convicções e moral e, aos poucos através da história, vamos o conhecendo compreendendo melhor e em partes. Mas não nego que as vezes todo esse moralismo pode ser irritante. A repressão de Allart sobre seus desejos e poder foi um pouco chata algumas vezes.
Dorilys é uma criança que também pode ser irritante e preocupante para a maior parte dos personagens. Mas no fundo ela era apenas uma vítima de tudo aquilo que acontecia. Se Allart tinha um laran maldito, Dorilys possui um laran incontrolável: ela pode manipular as tempestades e raios. Ninguém naquele mundo possui um dom assim, é quase como uma “bomba nuclear” guardada dentro de uma garotinha. Ela também é filha de um nobre, Lord Aldaran e, como filha única, o pai guarda em Dorilys grandes expectativas.
Sobre essas expectativas é interessante pensarmos o modo como a autora pode abordar diferentes pontos de vista. Por exemplo, como filho de um nobre, Allart tem um acordo de casamento arranjado, entretanto, ele não deseja se casar porque não deseja ter um filho que herde um dom tão terrível. Mas é sua obrigação como homem de uma grande casa e não seguir estes planos pode gerar guerras culminando em uma destruição terrível em termos diplomáticos. Em contrapartida, também nos é exposto a falta de opção que tem a prometida de Allart, criada que foi com um único objetivo de se casar e gerar filhos. Ela não tinha nenhuma outra ambição em sua vida.
“É isso o que fazem com todas as mulheres da nossa casta! […] mal largou as bonecas e já não consegue pensar em outra coisa a não ser o dever para com o clã” (Rainha da tempestade -Marion Zimmer Bradley)
Marion Zimmer consegue mostrar como essas exigências pesam em todos os envolvidos, como pais, filhos, irmão não podem simplesmente ceder aos próprios desejos, por mais nobres que sejam. A forma como aquilo tudo fora construído não os deixa muitas escolhas. E, nesse aspecto, o livro mais me parece com um drama, de todas as escolhas só existem os caminhos difíceis. Nesse quesito o mundo descrito no livro se parece bastante com o nosso, nem posso dizer que seja tão sofredor assim, por isso deixo aqui os pensamentos de um dos personagens, Donal, irmão de Dorilys:
“Também ainda sou muito jovem. E talvez não disponha de tempo suficiente para aprender a sabedoria. Mas se eu viver, posso descobrir que alguns dos meus problemas só existiam porque eu era jovem demais e muito tolo para compreender isso.” (Rainha da tempestade -Marion Zimmer Bradley)
(a resenha ficou um pouco grande, por isso é melhor conferir ela completa no Blog clubedolivrojf.wordpress.com)
site: https://clubedolivrojf.wordpress.com/2017/02/14/a-rainha-da-tempestade-marion-zimmer-bradley/