Fabio Brust 10/04/2011
"Estátuas de Sal", de André Cardinali
São Paulo destruída por Deus.
Foi essa frase que me conquistou, no livro de estreia de André Cardinali. Um pergaminho antigo encontrado no Afeganistão revela três profecias, cumpridas rigorosamente: uma crise, uma doença e uma nova Sodoma e Gomorra. A maior cidade brasileira sofre com um grande terremoto e é dizimada, matando seus habitantes. Entre eles, a mãe de Alice, a personagem principal.
Com o suicídio de seu pai, Alice torna-se reclusa e pensa ela mesma em se matar. Incapaz de fazê-lo, no entanto, ela decide ir atrás de pistas pelas quais o pai acabou por se matar, levando-se em conta o clima amistoso e pacífico criado com a destruição da cidade de São Paulo e a prova definitiva da existência divina que isso significaria. Isso acaba a levando para dentro da cidade destruída, um local proibido, e ao descobrimento de coisas que sequer poderia imaginar.
Para começar, queria dizer que achei o prólogo do livro totalmente desnecessário. A cena dos meninos afegãos encontrando os pergaminhos das profecias ficou um pouco deslocada, e não adicionada nada, em essência, à história. Eu simplesmente cortaria essa parte sem pensar duas vezes.
Apesar disso, a história tem um ritmo invejável para qualquer texto que tenha mais de sua metade preenchido com procura por pistas e movimentação exacerbada do personagem. Alice passa a primeira metade da história investigando, andando para lá e para cá, entrando em casas, abrindo gavetas, pesquisando, procurando símbolos e referências. Poderia ser uma parte entediante ou chata da história, mas, pelo contrário, foi extremamente bem construída. A escrita é ótima e rápida. Os enigmas que a personagem desvenda são ótimos. Não são fáceis e ela realmente batalha para conseguir entendê-los. Tudo faz absoluto sentido.
Não gostei muito de quando aparece a mensagem cifrada "Libertadores de Almas" com as letras disfarçadas de números. Para mim, pelo menos, ficou na cara desde o começo o que estava escrito, então, apesar de não saber como poderia modificar isso, acho que poderia ficar melhor se fosse diferente.
A história realmente nos leva a uma grande reflexão. Imagino que essa seja a intenção dela, de qualquer maneira. O livro foi escrito com o propósito de nos fazer pensar, e ele realmente me fez pensar. Passei pelo menos uma noite rolando na cama e pensando em todos os mistérios que se estendem à nossa frente e que somos completamente incapazes de desvendar. O último capítulo, a mim, foi muito bem escrito e contém diversas verdades. Exprime exatamente o que eu penso e já pensava a respeito desse assunto.
A linguagem do livro é boa, mas os diálogos ficaram informais demais. Apesar de ninguém falar palavras como "estar", no lugar de "tá", ou "vamos", no lugar de "vamo", acho que a leitura fica muito mais agradável se as palavras estiverem certas. Dá pra deixar a fala mais informal que a narrativa, mas não em excesso. Acho que daria para dar uma pequena corrigida nesse aspecto. Ainda assim, nada que tenha atrapalhado o andamento da história ou sua compreensão.
Algo que me agradou muito foi o fato de eu até agora não ter a mínima ideia de o que o autor acha. André Cardinali é ateu, católico, espírita? É difícil escrever um livro com um assunto tão polêmico quanto religião e permanecer neutro a respeito. Ele dá uma pincelada em diversos aspectos dela, e, no final, não sei se dá para dizer qualquer coisa a respeito dele, apenas a respeito da história. Eu tenho um livro sobre religião, e simplesmente não consigo deixar minha opinião de fora... André Cardinali está de parabéns pelo livro, como um todo!
Mais do que recomendo!