AndrAa58 31/12/2023
O objeto da literatura é a própria condição humana
O amor de Rodrigo Gurgel pela literatura é contagiante. O autor inicia argumentando que, antes da filosofia, a literatura é a forma de excelência para entender os problemas que temos e compreender o que move os seres humanos. Ele tece uma crítica acirrada a Barthes, alegando que o autor restringiu a interpretação literária à linguística.
“Esse foi o primeiro passo: acorrentar a interpretação literária à linguística e a um modelo único de literatura… o que significa, na verdade, apartá-la da vida e acreditar que o texto é a destruição de toda voz, de toda origem.”
No capítulo seguinte, o autor critica o modernismo, considerando-o um passo prejudicial para a arte literária. Ele é particularmente crítico em relação a Nietzsche, e aqui admito minha falta de base filosófica, pois não conheço muito da obra de Nietzsche. No entanto, percebo que minha interpretação, oposta a do autor em alguns pontos, pode ser falha, e sinto que preciso voltar à filosofia.
“As próprias características desses movimentos são múltiplas. Há uma mistura de futurismo, niilismo, de pensamentos revolucionários e conservadores, de naturalismo e simbolismo, de influências românticas e também clássicas.”
“…ocorreu uma interpenetração, um aglutinamento, uma fusão explosiva, entre razão e desrazão, entre intelecto e emoção, subjetividade e objetividade.”
No capítulo seguinte, ele aborda o foco na forma narrativa no modernismo. “…obriga o leitor a se envolver com a própria forma em que a história é narrada… o romance deixa de ser uma arte da aventura, o romance não narra mais o mundo, a vida, mas passa a ter a pretensão de criar uma nova vida… a forma se transforma no próprio conteúdo.” Este ano, vou enfrentar "Ulisses" de Joyce, logo logo verei se consigo tirar proveito de uma obra cuja vida é a forma ;-)
Minha deficiência filosófica se manifesta novamente, necessito aprofundar meu entendimento sobre o modernismo e o pós-modernismo para compreender melhor sua evolução e influência na literatura. Já tentei ler Derrida, e foi a leitura mais penosa e difícil que enfrentei até hoje, mas parece que terei que encarar se quiser voltar por aqui e conversar com o Gurgel.
O último capítulo é reconfortante, aquecendo o coração e suavizando um pouco a leitura. Fez-me refletir sobre:
1) A importância da palavra e do idioma.
“Não é nenhum exagero dizer que nos transformamos em criaturas espirituais quando passamos a ser criaturas verbais… E se as palavras são o espírito, então a qualidade de uma civilização depende da habilidade… e forma como utilizamos nosso idioma."
2) A importância da leitura atenta no desenvolvimento da personalidade.
“Só a leitura atenta e constante proporciona e desenvolve plenamente a personalidade… Um homem dono do seu espírito será alguém que apreciará as diferenças entre os seres humanos, porque compreender a originalidade de cada pessoa não é apenas uma questão de tolerância, mas principalmente de amor.”
“…se o objeto da literatura é a própria condição humana, aquele que lê as grandes obras e as compreende se tornará, não um especialista em análise literária, mas um conhecedor de si próprio e também do ser humano.”