Ruan Ricardo Bernardo Teodoro 12/01/2024
Tolkien escreveu uma Mitologia, não uma Memória Francesa
As palavras de John garth acima sintetizam a pesquisa da obra "Tolkien e a Grande Guerra", isto é, analisar e compreender como, após experienciar os horrores da 1° Guerra Mundial que inauguraram uma literatura da decadência por toda a Europa, John Ronald Tolkien pôde escrever estórias repletas de heroísmo e esperança.
Nesse sentido, Tolkien mitologizou em suas estórias a memória do bem e do mal despertada pela Guerra, de tal maneira a demonstrar a tirania da máquina sobre o indivíduo e o mal do materialismo que havia conduzido os países em batalha. Desse modo, seu conto de 1917, "A Queda de Gondolin", pode ser visto como um dos efeitos - mas não somente - do conflito: Uma cidade sitiada atacada por dragões e orcs cruéis.
Logo, Tolkien "podia ver o lança-chamas alemão e pensar em fogo grego" (p. 323), ou podia ver uma Oxford esvaziada pela guerra e pensar em uma capital élfica deserta. Desde sua infância, sua imaginação e criação baseada nos clássicos, com um gosto particular pelos épicos germânicos, contribuiram para que tivesse uma perspectiva mitologizada de sua vida.
Essa perspectiva, no entanto, não o afastava da realidade. Apesar de muitos críticos ávidos apontarem sua obra como escapista, afirma-se que seus escritos "refletem o impacto da guerra" (p. 315). Em especial em sua atitude de contrariar os movimentos literários pessimistas - escritos de guerra e modernismo - que predominaram após o conflito. Nesse sentido, enquanto os novos movimentos literários rejeitavam as antigas tradições, Tolkien não apenas as preservou, mas "as revigorou para sua própria era" (p. 321).
Nessa mesma toada, o professor se posicionou contra o desencanto que abateu os artistas após a 1° Grande Guerra. Para eles, a crueza do conflito e o horror que vivenciaram empalideceram suas sensibilidades, originando uma literatura pessimista que via na batalha o fim da inocência e a inutilidade do esforço, cujos expoentes foram Robert Graves, Wilfred Owen e Siegfried Sasson. Em contrapartida, as estórias de Tolkien "descrevem a luta para manter valores herdados, instintivos ou inspiradores contra as força do caos e da destruição" (p. 333).
Além disso, destaca-se que o estudo investiga os escritos de Tolkien antes, durante e imediatamente após a guerra, entre eles: sua língua élfica "quenya", os poemas "The Shores of Faerie", "The Happy Mariners", "A Song of Aryador", "Kortirion Among the Trees", o conto "The Fall of Gondolin" e a obra "The Book of Lost Tales". A partir desses escritos, Tolkien já gestava a mitologia que iria compor "O Senhor dos Anéis", uma criação que uniu seu interesse pela linguagem com a mitologia.
Por fim, aponta-se que "a Terra-média contradiz a visão dominante da história literária, de que a Grande Guerra deu fim às epopeias e tradições heroicas em qualquer forma séria" (p. 315). De fato, foi por meio de um medievalista, místico e católico que o mundo moderno teve revigorada a tradição que preza as canções das fadas.