Queria Estar Lendo 25/02/2022
Resenha: Os Cem Mil Reinos
Os Cem Mil Reinos é o primeiro volume da trilogia de fantasia adulta da N.K. Jemisin, lançado aqui pela Galera Record. Uma história épica que envolve muita política, deuses caídos e uma possível guerra a eclodir.
Yeine viaja até o palácio do Céu, lugar onde a família de sua mãe reside e governa, a pedido do avô; Dekarta é o governante supremo e está prestes a realizar a cerimônia de sucessão. Quando chega lá, Yeine descobre que, mesmo depois da mãe ter abandonado e dado as costas para a família, a garota ainda foi chamada para participar como uma das possíveis sucessoras. Se sobreviver, pode herdar o trono dos Cem Mil Reinos.
Mas ela está ali para entender a misteriosa morte da mãe, e não se envolver em jogos de poder. O que a surpreende, no entanto, quando deuses aprisionados naquele palácio oferecem ajuda; o preço deles é mortífero, mas pode trazer a ela as respostas que tanto procura.
Os Cem Mil Reinos é um épico de fantasia criativa, com um universo rico em informação, personagens dúbios e deuses traiçoeiros.
A história que Jemisin conta nesse primeiro volume tem começo, meio e fim; e, do começo até o final, é satisfatória, com reviravoltas inteligentes e uma construção de mundo pra lá de fascinante.
Tanto o palácio do Céu quanto todos os territórios ao redor são ricos em detalhes, cultura e curiosidades. Darr, de onde Yeine vem, é governado por uma sociedade matriarcal, que fortifica suas mulheres através de rituais brutais a fim de extrair delas o máximo de força. Yeine sobreviveu a eles, e mesmo assim não está preparada para a crueldade que habita o palácio dos Arameri, a família de sua mãe.
O mistério que envolve a morte da mãe e sua investigação entre os corredores do palácio é instigante, mantém nossa atenção a qualquer mínimo detalhe que possa virar o jogo. Quando vira, é surpreendente.
"- Matar a quem nós mais amamos é uma longa tradição em nossa família."
Porque estamos lidando com deuses, tudo que envolve a jornada da Yeine na história é pra lá de perigosa. Não apenas perigosa, mortífera. Ela sabe disso, entende logo no seu primeiro encontro com o Senhor da Noite e, ainda assim, é corajosa o suficiente para seguir em frente.
Pense numa protagonista inteligente, que dá gosto de acompanhar. Toda a personalidade da Yeine é traçada pela incerteza do seu passado, por querer entender quem a mãe era antes de deixar o palácio e a família terrível, e também pela incerteza do futuro, uma vez que, chegando ali, descobre estar no caminho para o trono - se sobreviver a esse caminho.
Os Cem Mil Reinos trata o caminhar da Yeine como um desenvolvimento interessante, cheio de altos e baixos, de escolhas ruins e poderosas. E sua ligação com os deuses é o que mais enche as páginas.
A princípio, prisioneiros perigosos, os deuses logo se tornam peças importantíssimas na trama política da história. Depois da guerra, eles foram sentenciados a servir os humanos daquela família para pagar por sua traição; mas qual foi a traição, o que motivou a guerra entre os deuses, quem é realmente o vilão? São questões que inquietam a trama, e que motivam Yeine a seguir em frente.
"Jamais seremos deuses, afinal; mas é assustador a facilidade com que nos tornamos menos que humanos."
Sua relação com dois dos deuses: Sieh, da trapaça, e Nahadoth, Senhor da Noite, foram as mais importantes. Sieh e Yeine mantém um relacionamento de filho e mãe, irmão mais novo e irmã mais velha, melhores amigos; é curioso, porque ele começa como uma figura a se desconfiar, mas a trama te envolve nas peculiaridades e na estranheza e no quanto ele é único para o desenrolar da história.
Nahadoth, por outro lado, começa como a maior ameaça de todas, e minha nossa como o desenvolvimento dele foi maravilhoso! Dele e da Yeine, como um tudo, porque eles dependem um do outro ao mesmo tempo em que vivem momentos solitários. É uma entrega e uma escuridão que ameaça, mas que também oferece liberdade.
Não vou falar mais que isso, porque a graça desse relacionamento está justamente nas surpresas que ele traz.
Para além dos conflitos entre os deuses e a incerteza da protagonista, também temos uma trama política intensa e tenebrosa correndo solta pelos Cem Mil Reinos. Não apenas no palácio, mas entre reinos; aqueles que são aliados, aqueles que podem ser massacrados sob a sombra de um sucessor terrível.
"- Vocês escolheram a guerra, não eu. Eu não lutarei de forma justa."
Mais uma vez, com Os Cem Mil Reinos, N.K. Jemisin mostra que é a rainha da fantasia.
Apesar de preferir a capa gringa, porque passa mais a vibe de FANTASIA ADULTA que é esse livro (adulta, gente, +18, ok?), a ilustração é bonita. Gostei da tradução da Ana Cristina Rodrigues e da edição como um todo; só queria que ele vendesse mais o épico de política que é. Corrigi muita gente que olhava pro livro esperando um YA.
Os Cem Mil Reinos é uma história única, com um universo moldado por deuses e destruídos por eles. Uma trama em que política, fantasia e poder feminino se entrelaçam de maneira brilhante.
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