Sebo Por Todo C 08/08/2014
E que contador de histórias!
A Majestade do Xingu, Moacyr Scliar
Planeta DeAgostini, 2004, São Paulo, 216 páginas
A minha primeira leitura de Scliar foi o divertido A mulher que escreveu a Bíblia. A personagem responsável pela tarefa hercúlea e de tamanha responsabilidade nos passa anônima, relatando seu trânsito pelo século X a.C. vinda de uma família chefiada por um obscuro chefe tribal até o seu destino maior: mulher de Salomão, mesmo que fosse uma entre as setecentas desposadas pelo sábio rei.
E Scliar novamente mantém anônimo o narrador de A Majestade do Xingu, publicado em 1997, nesse livro em que conta os percalços da vida de imigrantes judeus vindos da Bessarábia, atual Moldova. Como tantos outros, para cá vieram em busca da terra cheia de promessas de riqueza, em busca de paz e de distância dos temíveis progroms -- as assim chamadas perseguições e morte de judeus, violência existente muito antes da Segunda Guerra.
A história começa em um quarto de hospital onde o narrador se recupera. Ao médico que o acompanha conta a trajetória de sua vida e também a de Noel Nutels seu amigo e de quem guarda muita admiração.
A família do narradar e os Nutels se conheceram no navio Madeira, na cansativa travessia que os trouxe ao Brasil. Os dois meninos rapidamente ficaram amigos, amenizando o trajeto entre brincadeiras e imaginação. Noel se destacava como liderança e o narrador lhe cobria de admiração, ele que seria seu amigo para sempre.
A família Nutels fixou-se em uma pequena cidade de Alagoas enquanto o pai do narrador achou que encontraria melhores oportunidades na sua profissão de sapateiro numa cidade em franco crescimento: era a São Paulo, meados dos anos 1920.
Apesar da distância, o narrador acompanhou como podia a vida de Noel: um conhecido da família trazia uma notícia, um aparentado outra. E assim soube que Noel estudou Medicina, participou da política da época em manifestações contra Getúlio Vargas, seus amigos eram escritores e intelectuais. Tornou-se médico sanitarista e, surpresa das surpresas, parte com a mulher para o distante Xingu, a partir daí dedicando-se à causa indígena. Famoso por seu envolvimento nessa causa passou a ser admirado por muitos.
Ao narrador cabe o destino de lojista no bairro do Bom Retiro, um grande leitor, é bem verdade mas um lojista medíocre e de poucos ganhos.
Moacyr Scliar foi um contador de histórias de primeira, um escritor de mão segura, estrutura descomplicada e firmemente projetada. Culto, informado, tinha o que dizer. E o melhor: faz isso com muito humor. Em A Majestade do Xingu entrelaça o tema da imigração, a adaptação ao novo país, os descendentes brasileiros por nascimento ou opção e o movimento de esquerda dos anos 1960 e 1970 situações que passam pelo olhar de um comerciante de parcos ganhos, homem comum, leitor voraz, o narrador sem nome.
Pena que descobri a delícia que é ler os livros do médico Scliar poucos meses antes de seu falecimento. E ironia típica de Scliar: tanto o autor quanto o narrador sofriam do mesmo mal.
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